sexta-feira, 5 de outubro de 2018

Acupuntura e a prática da Psicologia


  A profissão  de  técnico de acupuntura,  médico  acupunturista  e profissionais de saúde especializados em acupuntura (acupunturistas com formação de nível superior) no Brasil, ainda está sem critérios legais para regulamentação de sua formação. 

Apesar de ser uma ocupação reconhecida por diversos conselhos profissionais (vide lista de portarias em anexo), fazer parte dos serviços de saúde oferecidos no SUS - Sistema Único de Saúde (Portaria 971 do Ministério da Saúde, 2006), assim como também estar incluída no Catálogo Brasileiro de Ocupações editado pelo Ministério do Trabalho, 1977, em convênio com a OIT (Organização Internacional do Trabalho (MT/OIT/UNESCO-Bra 70/550 nº 0.79 – 15,  onde se define a categoria "Acupunturista"), no Brasil, o acupunturista ainda está sem critérios legais para regulamentação de sua formação e exercício profissional.

O objetivo do presente texto é a tentativa de entendimento de uma das querelas interprofissionais: a "despropositada" intervenção de segmentos da classe médica, para contestação da Resolução nº 05 de 24 de maio de 2002 do CFP - Conselho Federal de Psicologia, que autorizava os profissionais desta categoria a prática da acupuntura. O Colégio Médico de Acupuntura – CMA, através da ação ordinária solicitou a anulação do ato administrativo do CFP, com ação iniciada em agosto de 2002.

Em 2002, o CFP foi o oitavo conselho federal de saúde a reconhecer a acupuntura como especialidade e prática reconhecida para suas respectivas categorias profissionais.  Em 23 de agosto de 2004, houve a decisão judicial, proferida pelo Juiz Federal Alexandre Vidigal de Oliveira considerando improcedente o pedido do Conselho Federal de Medicina de suspensão da citada  Resolução nº05/2002, editada pelo Conselho Federal de Psicologia, que reconhece o uso da acupuntura como um recurso complementar ao trabalho do psicólogo. (Vectore, 2005)

Este processo havia sido julgado pelo TRF - Tribunal Regional Federal e decido nessa instância que “não estão, os profissionais da Psicologia, habilitados para a prática do diagnóstico clínico e prescrição de tratamento, por isso considerando improcedente. Ação esta  contestada e vencida como vimos em 2004. Contudo por recorrência Conselho Federal de Medicina foi a novo julgamento no STF - Supremo Tribunal Federal.

Apesar recurso do CFP apresentado ao STF (junho/2013), este manteve a decisão proferida pelo TRF 1ª Região de anulação da Resolução CFP 05/2002, que reconhecia a acupuntura como recurso complementar no trabalho da(o) psicóloga(o), uma vez que, houve o entendimento de que é competência da União legislar sobre as condições do exercício das profissões regulamentadas.  

A partir desta decisão o Sistema de Conselhos de Psicologia, iniciado pelo CRP – SP ponderou que estando o psicólogo(a) apto a assumir responsabilidades profissionais para as quais está capacitado pessoal, teórica e tecnicamente (como previsto em seu código de ética), e considerando caráter multiprofissional e livre do exercício da Acupuntura no Brasil, não há óbice ou qualquer impedimento para que o psicólogo possa atuar no campo. Recomendando apenas que não vinculasse a sua prática como acupunturista à profissão de psicóloga(o) entendendo também, que essa vinculação, por si só, não constituirá falta ética sobre a qual recairá qualquer procedimento disciplinar (CRP-SP, 2015)

O estado atual do impedimento do exercício da acupuntura por profissionais de psicologia limita-se portanto apenas à vinculação da prática simultânea de acupuntura e psicologia em uma mesma ação clínica ou espaço profissional (supõe-se). Contudo quero me deter na argumentação proferida nesse julgamento, o entendimento de que psicólogos não podem exercer a prática da acupuntura “por se tratar de matéria não prevista na Lei que regulamenta a sua profissão” e portanto a  Resolução nº 05/2002 do CFP é ilegal e deveria ser anulada.

Resumindo, cabe também aqui a ressalva de que no Brasil a acupuntura foi praticada por psicólogos, autorizados pelo CFP, por mais de dez anos (2002-2013) sendo fiscalizada pela Associação Brasileira de Acupuntura, (até a sua desautorização, ainda em discussão, em 2013). Além disso já existe ampla literatura e artigos publicados sobre sua pertinência no tratamento de patologias mentais decorrente desse exercício, sendo também a psicologia corporal e bioenergética consideradas uma prática complementar no tratamento da dor, tensão muscular e ansiedade em doenças crônicas. (Oliveira, 2013)

Psicologia clínica.

Observe-se inicialmente que na história do reconhecimento da acupuntura no Brasil, já constava sua aplicação a doenças nervosas e saúde mental, estava previsto que o acupunturista executasse o tratamento de distúrbios psicológicos (psíquicos), nervosos além de outros distúrbios orgânicos e funcionais;

Naturalmente, ou melhor, possivelmente, para julgar os psicólogos  como não aptos a intervir em distúrbios relativos à saúde mental, os juristas devem ter-se detido na lei nº 4.119, de 27 de  agosto de 1962, que instituía a profissão de Psicólogo e especificava que constitui função privativa do Psicólogo a utilização de métodos e técnicas psicológicas com os seguintes objetivos:

a) diagnóstico psicológico;
b) orientação e seleção profissional;
c) orientação psicopedagógica;
d) solução de problemas de ajustamento.

Entendimento este que aparentemente ignora que o diagnóstico psicológico se aplica à condições clínicas, e que estas foram superficialmente compreendidas como “solução de problemas de ajustamento”. Naturalmente que este termo "ajustamento"  já sofreu muitas críticas, sobretudo por psicólogos sociais e comunitários que preveem para a profissão de psicólogo: a ocupação de cargos de administração no poder público, e  o empodeiramento de populações para que venham obter as necessárias reformas sociais que lhes proporcionem melhor condição e qualidade de vida. Apesar do termo ajustamento ser uma nítida referência a capacidade de adaptação das teorias do stress (físico e psicológico) e  da biologia evolutiva.

Observe-se também que a essência  da pratica da acupuntura é a estimulação e que o estudo da estimulação sensorial, sua medida, e efeito neurofisiológico foi o berço de origem da psicologia científica. Seja nos estudos de psicofísica de Ernest Heinrich Weber (1795-1878) e Gustav Fechner (1801-1887), sobre a intensidade física dos estímulos e magnitude da sensação psicológica ou mesmo do próprio W. Wundt (1832-1920), no primeiro laboratório de pesquisa de psicologia. 

Wilhelm Wundt, foi assistente de Hermann Helmholtz (1821-1894) no Instituto de Fisiologia da Universidade de Heidelberg, e Helmholtz, foi quem mensurou a velocidade do impulso neural (antes da invenção dos aparelhos de eletroneuromiografia). Dando seguimento aos estudos de psicofísica. Devemos a Wundt também a proposição dos princípios básicos para estudo da fisiologia da consciência (enquanto substrato material da vida mental) e determinação das quatro características fundamentais das sensações (qualidade, intensidade, extensão, duração). Diga-se de passagem características essências para o entendimento da  reflexologia e mesmo das científicas interpretações ocidentais dos efeitos da acupuntura.

Psicoterapia

Além do limitado entendimento da psicologia por parte dos operadores do direito ou juristas do STF, como visto, observe-se ainda que a interpretação da referida "solução de problemas de ajustamento" apenas no âmbito psicopedagógico e organizacional, omite (leia-se ignora) sua aplicação clínica e estudo da utilização de índices psicofisiológicos, como os aqui mencionados. Os representantes do Colégio Médico de Acupuntura – CMA e Tribunal Regional Federal da Primeira Região, ignoraram principalmente a resolução do Conselho Federal de Psicologia de inclusão das atividades de psicoterapia na matéria (prevista por Lei) para regulamentar a profissão de psicólogo.

Reporto-me ao texto das “Atribuições Profissionais do Psicólogo no Brasil - Contribuição do Conselho Federal de Psicologia ao Ministério do Trabalho” destinado a  integrar o CBO - catálogo brasileiro de ocupações – enviada em 17 de outubro de 1992, onde melhor se especificou a dimensão do diagnóstico e/ou sua aplicação na psicoterapia como atividades do Psicólogo Clínico.

Nesse referida publicação pode-se ler que o psicólogo atua na área específica da saúde, colaborando para a compreensão dos processos intra e interpessoais, utilizando enfoque preventivo ou curativo, isoladamente ou em equipe multiprofissional em instituições formais e informais. Realiza pesquisa, diagnóstico, acompanhamento psicológico, e intervenção psicoterápica individual ou em grupo, através de diferentes abordagens teóricas.

A descrição de ocupação do psicólogo (no detalhamento das atribuições) inclui nos seguintes itens (aqui selecionados):

1 – Realiza avaliação e diagnóstico psicológicos de entrevistas, observação, testes e dinâmica de grupo, com vistas à prevenção e tratamento de problemas psíquicos.

2 – Realiza atendimento psicoterapêutico individual ou em grupo, adequado às diversas faixas etárias, em instituições de prestação de serviços de saúde, em consultórios particulares e em instituições formais e informais.

4 – Realiza atendimento a crianças com problemas emocionais, psicomotores e psicopedagógicos.

5- Acompanha psicologicamente gestantes durante a gravidez, parto e puerpério, procurando integrar suas vivências emocionais e corporais, bem como incluir o parceiro, como apoio necessário em todo este processo.

7- Trabalha em situações de agravamento físico e emocional, inclusive no período terminal, participando das decisões com relação à conduta a ser adotada pela equipe, como: internações, intervenções cirúrgicas, exames e altas hospitalares.

13-Realiza pesquisas visando a construção e a ampliação do conhecimento teórico e aplicado, no campo da saúde mental.

17-Participa de programas de atenção primária em Centros e Postos de Saúde ou na comunidade; organizando grupos específicos, visando a prevenção de doenças ou do agravamento de fatores emocionais que comprometam o espaço psicológico.

Psicologia clínica, abordagens teóricas afins

O termo psicoterapia foi utilizado pela primeira vez em 1872, por um médico inglês, Daniel H. Tuke (1827-1895) no seu “Manual of Psychological Medicine” (1858), este teve ampla repercussão, integrando-se paulatinamente à psiquiatria (alienismo), à psicanálise, e finalmente à psicologia, multiplicando-se as interpretações de seu significado e práticas decorrentes. Há mesmo autores que acreditam ser inoperante classificar da diversas formas de psicoterapia, considerando que surgiram mais de setenta escolas dessa ciência e técnica  no mundo, a partir da segunda metade do século XX.

No século XX constata-se a progressiva conquista da teoria e técnica proposta por Sigmund Freud (1856-1939). Pode-se esboçar a trajetória científica da psicanálise como abandonando inicialmente as suas relações com o estudo neurológico das afasias, abandonando a incipiente e tóxica psicofarmacologia da época, e mesmo o tratamento da histeria através da hipnose, estruturando-se como ciência no exercício clínico. 

Já consagrada como "terapia da palavra", a psicanálise, fundamenta-se, além da metodologia clínica, no estudo antropológico dos costumes e pesquisas sobre arte, religiões, e naturalmente sobre linguística e teoria da literatura. Afirma-se paulatinamente como não exclusiva de profissionais de medicina. Contudo circunscrevendo as demandas da psicopatologia, da psicologia jurídica dos sociopatas e  inimputáveis, além da medicina psicossomática, vem retornando, na atualidade, ao “projeto de uma psicologia para neurologistas” ou neuropsicologia.  É visível esta tendência com a recriação da neuropsicanálise, cujo marco histórico pode ser a criação da Internacional Neuropsychoanalysis Society em Nova York, 1990. Observe-se porém que  não perdeu a abertura teórica e técnica de ser exercida por profissionais não médicos.

Na apresentação dos "textos geradores do ano da psicoterapia", a psicoterapia é reconhecida como prática do psicólogo, por se constituir, técnica e conceitualmente, um processo científico de compreensão, análise e intervenção que se realiza através da aplicação sistematizada e controlada de métodos e técnicas psicológicas reconhecidos pela ciência, pela prática e pela ética profissional, promovendo a saúde mental e propiciando condições para o enfrentamento de conflitos e/ou transtornos psíquicos de indivíduos ou grupos. (Resolução CFP nº 10/00, de 20 de dezembro de 2000)

Ainda segundo esse texto do Conselho Federal de Psicologia, constata-se que na atualidade, existem mais de 250 modalidades distintas de psicoterapias. Numa lista considerada não exaustiva, na classificação de Escolas de Psicoterapia (há setenta denominações no mundo), pode-se identificar três grandes grupos:

1) Psicoterapias arcaicas ou clássicas (sete denominações, por exemplo, hipnotismo);

2) Psicoterapias psíquicas ou psicocorporais, derivadas ou dissidentes da psicanálise, conhecidas como “novas terapias” (com 39 denominações, por exemplo, psicodrama e gestalt-terapia);

3) Terapias do comportamento, ditas também terapias cognitivo comportamentais
(TCC) – (10 denominações, por exemplo, terapia cognitivo-comportamental e dessensibilização pelos movimentos oculares).

Identificam-se ainda outras modalidades, incluídas em outra seção, classificadas segundo as Escolas de psiquiatria ou de psicopatologia ditas dinâmicas ou psicodinâmicas (aliança de uma forma clínica e de um sistema de pensamento, inclui: psicanálise; psicologia clínica; psicoterapia institucional; psicologia analítica e psicologia individual).

Creio ser ponto pacífico que acupuntura, a ioga e outras técnicas de origem oriental se inserem no grupo das intervenções psicossomáticas, psicoterapias bioenergéticas ou corporais. 

A questão essencial da proposição do CFP sobre a psicologia clínica e, em especial, as psicoterapias, é, se estas podem e/ou devem ser definidas como ciência?

O próprio CFP nos apresenta uma lógica e brilhante resposta:

... as psicoterapias não podem e não devem ser definidas como ciência. Não podem porque – como argumentamos acima – elas não se enquadram no espaço epistêmico da racionalidade moderna. Não devem porque sua não cientificidade não é defeito a ser corrigido no futuro, mas é o traço essencial de um saber cuja fecundidade reside justamente em resistir à pretensão de uma objetividade e de uma operacionalidade universais. As psicoterapias possuem caráter sapiencial que as aproxima dos antigos exercícios espirituais e sua riqueza consiste não só em resistir ao avanço da administração total da vida, mas em preservar o lugar antes ocupado pela sabedoria antiga. (Conselho Federal de Psicologia. Ano da Psicoterapia, textos geradores. CFP.    XIV Plenário; Gestão 2008 - 2010)

Por outro lado autores como, Stahl, Schwartz e Sachdeva, propõem modelos científicos para o que denominam farmacopsicoterapia, onde o efeito da psicoterapia é comparado a uma droga epigenética, ou seja, capazes de produzir modificações que não envolvem mudanças na sequência de DNA do organismo. Os citados autores analisam evidências e nos sugerem que tanto a farmacoterapia como a psicoterapia podem atuar convergindo sua ação, possivelmente em neurocircuitos semelhantes, alterando o funcionamento do cérebro como um todo, ao aliviar sintomas psiquiátricos em quadros de depressão e ansiedade, por exemplo.

Jacques Alain Miller (1944), um dos fundadores da École de la Cause Freudienne, distingue as psicoterapias das intervenções diretas sobre o cérebro, cirúrgicas, elétricas ou químicas, entretanto inclui no campo contemporâneo das psicoterapias, as intervenções sobre a realidade psíquica advindas da sabedoria oriental e destaca as que "passam pelo corpo", (formas de ginástica advindas das sabedorias orientais) e ocidentais da antiguidade, de dominação psíquica das funções e apetites somáticos, ou as disciplinas de maestria do corpo.  

Algumas considerações sobre a acupuntura

Apesar do seu reconhecimento como arte terapêutica e medicina tradicional, patrimônio cultural intangível da humanidade (UNESCO, 2010) sua integração ao sistema de saúde hegemônico e conhecimento científico tem sido igualmente controvertida.

A tese do presente autor (Costa, 2000) destaca a importância da compreensão das caraterísticas psíquicas e neurológicas para o entendimento ocidental da acupuntura. Esta proposição considera que estamos diante de uma versão etnomédica do antigo conhecimento oriental (asiático) sobre o cérebro e/ou funções do sistema nervoso. Ou seja, considera que utilizando a metodologia desenvolvida pela antropologia estrutural, pode-se investigar como o cérebro sua anatomia, funções e disfunções, podem ser tomados como objeto de estudo da antropologia/etnografia ao ser considerado como análogo aos invariantes biológicos ou mitemas, como por exemplo o modo como os animais podem ser estudados (na etnozoologia) e se constituem como invariantes, os zoemas (Levi-Strauss, 1986 p.99) nas distintas narrativas míticas.
Autores como Oliver Sacks (1933-2015) e Clifford Geertz (1926-2006) denominaram o estudo da interface cérebro, mente, cultura como neuroantropologia, área do saber que até mesmo já se constituiu como uma comunidade de pesquisadores, a Sociedade Internacional de Neuroantropologia. Onde se pesquisa tentando desvendar o enigma de como o cérebro pode ser pensado (e estudado ou como a mente e os processos cognitivos produzem a cultura que lhe produz e organiza.

A realidade é que o estudo da acupuntura em sua essência não diverge do estudo de como diferentes povos lidam com o processo de adoecimento, o comportamento social e a adaptação do ser humano, e esta questão é o principal objeto da etnomedicina (Fábegra, 1975)

A capacidade desse sistema etnomédico para modificar estados, sinais e sintomas de diversas patologias do sistema nervoso, especialmente a dor, é reconhecida e pesquisada no ocidente há pelo menos 3 décadas, quando houve um reconhecimento formal da OMS. Em 1980 a OMS publicou uma relação com cerca de 40 patologias e estados patológicos com eficácia reconhecida onde pelo menos 22 são distúrbios funcionais (psicossomáticos) que envolvem o controle direto do Sistema Nervoso Central - SNC e/ou - Sistema Nervoso Autônomo SNA

Na acupuntura, a mais conhecida técnica da Medicina Tradicional Chinesa, encontra-se a identificação de muitos sinais e sintomas de alterações da função nervosa como dor (cefaléia, associadas e não associadas à dano nas estruturas do sistema periférico - segmentar), ansiedade, distúrbios autonômicos emocionais, alterações reflexas de tônus e postura, tremores, alterações comportamentais e cognitivas associadas a disfunções elétricas e funcionais do cérebro (convulsão, hiperatividade, demência, retardo e deficiência mental) que podem ser avaliados e tratados por intervenção em pontos que se distribuem por todo o corpo, nos distintos meridianos identificados por essa técnica, associada ou não a outras formas de tratamento da medicina tradicional chinesa, onde se inclui a administração de compostos fitoterápicos (psicoativos inclusive) e outras formas de intervenção.

É bem verdade, que esses sinais e sintomas estão descritos e trabalhados de modo distinto da medicina ocidental, mesmo assim, esta pode beneficiar-se dessa antiga forma de intervenção terapêutica como referência de pesquisa e/ou pratica clínica e vice versa.

Na monografia de especialização em acupuntura do presente autor, orientada pelo professor Jurecê Machado, que na época administrava uma clínica escola associada a Associação Brasileira de Acupuntura – seção Bahia, fundada pelo Prof., Haeckel Meyer, foi elaborada uma lista de fenômenos e manifestações orgânicas (fisiopatológicas e clínicas) do sistema nervoso que são simultaneamente abordadas pela acupuntura e/ou neuropsicologia e medicina psicossomática, a saber:

Alterações na organização cíclica temporal (relógios biológicos): o tempo e possíveis marcadores de ritmos e ciclos ultradianos, circadianos, cósmicos e especialmente o Ciclo Vital, onde estudaremos as depressões, especialmente sazonais, a insônia, os distúrbios menstruais e da função sexual.

Alterações do desenvolvimento neuropsicomotor: como o próprio nome sugere, trata-se de uma abordagem simultânea das aplicações multidisciplinares no tratamento (por neuroestimulação ou estimulação precoce) do comportamento motor (especialmente o tônus) e cognitivo (linguagem, Inteligência) de crianças com características normais e patológicas, (com e sem retardo mental, déficit sensorial e alterações posturais). Identificaram-se na Medicina Tradicional Chinesa proposições explicativas e tratamentos para, o retardo mental, a hiperatividade, epilepsias e paralisias.

Distúrbios emocionais: onde a tarefa da psicologia com as diversas teorias dos afetos e comportamento emocional é tão significativa para complementar o trabalho da neurofarmacologia e especialmente na compreensão das doenças mentais ou mesmo alterações comportamentais associadas a distintas patologias orgânicas. Patologias consideradas de natureza psicossomática e emocional como, asma, hipertensão arterial, distúrbios da função sexual são identificadas e tratadas pela acupuntura.

Alterações da mente/ espírito, ou funções mentais superiores: o estudo dessas funções concentrando-se no estudo da linguagem enquanto determinante da conduta e nos quadros psicopatológicos cujo diagnóstico e tratamento por acupuntura começam a ser reconhecidos e mencionados nos manuais de tratamento, a exemplo da depressão, histeria, ansiedade e mesmo a psicose. Mais recentemente tem se evidenciado que o tabagismo e  outras formas de drogadição, também podem ser tratados pela acupuntura, especialmente se associados a técnicas de meditação auto-conhecimento e libertação (wu-wei, satori, samhadi)  descritos nos textos sagrados, mitos, aforismos da cultura tradicional oriental que servem de modelo e complementação a algumas técnica psicoterápicas como anteriormente descrito.

Dor, nessa área, onde predomina a abordagem neurofisiológica da anestesia e clínica, também tem sido relevante a contribuição da acupuntura para compreensão dos mecanismos fisiológicos da dor, as suas contribuições se somam as da neuropsicologia, especialmente dos processos depressivos e aspectos emocionais da propriocepção e inauguram uma nova perspectiva de compreender a acupuntura em nível microscópico e molecular.

Na citada monografia, "o mar de dentro" (Costa, 2000), abordou-se especialmente o conhecimento sobre o sistema nervoso nas disciplinas anatomia, neurobiologia e neuropsicologia embora já se saiba que muitas das explicações sobre o efeito clínico da acupuntura vêm da imunologia, da endocrinologia e da medicina psicossomática, seja essa última interpretada na escola psicanalítica ou medicina comportamental, apesar da ênfase dada ao estudo das propriedades reflexas do sistema nervoso ou reflexologia pavloviana. Autores mais recentes tem proposto o termo psiconeuroendocrinoimunologia para substituir a manifestação psicossomático ou referindo-se a qualquer atividade do sistema nervoso. 

O exercício/ estudo da acupuntura por  equipe multiprofissional deve considerar que na abordagem da neurociência, ainda não há uma concordância plena dos métodos de estudo e especificidades profissionais que atuam sobre essa classe de sinais e sintomas que envolvem a integridade e funcionamento do sistema nervoso. 

Seguindo a atual divisão das especialidades médicas e paramédicas esboçamos aqui uma lista provisória das intervenções interdisciplinares sobre as síndromes, sinais e sintomas referidos e estudados em:

Neurologia/ Fisioterapia: acidente vascular; paralisias, paresias, parestesias, tremores, convulsão, demência e retardo mental.

Medicina psicossomática/ Clínica médica: asma, alergias, hipertensão, taquicardia, constipação (prisão de ventre), colite, gastroptose, frigidez, vaginismo, impotência, ejaculação precoce.

Psiquiatria/ Psicologia: hiperatividade, ansiedade; depressão, psicose. 

Uma abordagem metodológica de tais distúrbios com esta proposição deve ser, além de multiprofissional e interdisciplinar, considerar-se análoga a um trabalho bilíngue / transcultural, como também  a constatação de uma impossibilidade de correspondências exatas em todos os níveis ou sentidos dos sistemas em questão.  

Para concluir

Falar de acupuntura para antropólogos e neurocientistas como num texto "bilíngüe", um texto escrito em dois sistemas linguístico – descritivos (jargões técnicos) é a proposição (ambição) da maioria dos textos ocidentais e quiçá orientais. A maioria dos estudos e monografias publicadas tenta esta abordagem descreve-se uma patologia na ótica ocidental e em seguida na medicina tradicional, sendo que poucos trabalhos abordam a eficácia das técnicas empregadas.

Ainda está por ser realizado um estudo que realmente integre o referencial correspondente a medicina cosmopolita ocidental e mais especificamente das neurociências associado a epidemiologia clínica (medicina baseada em evidências) e outro correspondendo a medicina tradicional chinesa, considerando a tradição chinesa presente na práticas sobreviventes e /ou identificada em seus textos mais antigos, sendo interpretada como um conjunto coerente na ótica da etnologia (ao nosso ver melhor compreendido a partir da orientação da antropologia estrutural).

A compreensão do taoísmo / confucionismo tem se revelado essencial para compreensão da própria estrutura da organização da cultura chinesa, além de constituírem-se como contribuições, ainda atuais, à filosofia e à ética da prática terapêutica. Observe-se que, o taoísmo (religião cujo principal texto sagrado é o Tao Te King) junto com o budismo, religiões tibetanas e hindus formam a base das práticas orientais de meditação, que como veremos se associam ao conhecimento médico tradicional e à moderna psicoterapia, como referido por muitos autores incluindo o próprio C. G Jung (1875-1961) na década de 30, (do século XX), na apresentação ao ocidente de um dos primeiros textos que aproximam as técnicas ocidentais às práticas orientais: "O segredo da flor do ouro, um livro de vida chinês".  

              O que torna espantosa e completamente esdrúxula a afirmação de que acupuntura “é matéria não prevista na Lei que regulamenta a profissão de psicólogo

Referências

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ILUSTRAÇÃO

Símbolo da Psicologia Ψ, a 23ª letra do alfabeto grego

針灸 Zhēnjiǔ / 針 (Zhēn: Agulhamento) 灸 (Jiǔ: Moxabustão)


ANEXO

LISTA DE INDICAÇÕES DA ACUPUNTURA, DA ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE (OMS) [STUX G.;  POMERANZ B., Basics of Acupuncture de Springer, Fourth Edition, 1997, pg 307) ] saved from: < http://www.smba.org.br/informacoes/respostas-12.html
 > SMBA On-line - Sociedade Médica Brasileira de Acupuntura

Leis citadas

LEI Nº 4.119, DE 27 DE  AGOSTO DE 1962. - Atribuições Profissionais do Psicólogo no Brasil - Contribuição do Conselho Federal de Psicologia ao Ministério do Trabalho” destinado a  integrar o CBO - catálogo brasileiro de ocupações – enviada em 17 de outubro de 1992.

PORTARIA Nº 971, DE 03 DE MAIO DE 2006
Aprova a política nacional de práticas integrativas e complementares (pnpic) no sistema único de saúde.

Reconhecimento da prática da acupuntura por Conselhos Profissionnais

COFITO - Conselho Federal de Fisioterapia e Terapias Ocupacionais: 
RESOLUÇÃO COFITO N° 60, DE 29 DE OUTUBRO DE 1985

CFO - Conselho Federal De Odontologia, Resolução185/1993

CFB - Conselho Federal de Biomedicina: reconhece , através da Resolução no. 02/86 e 02/95, que o biomédico pode ser orientado à prática da Acupuntura (Resoluções CFB Ab. 2012)

CRP - Conselho Federal de Psicologia: na Resolução CFP nº 05/2002, regulamentou a prática da acupuntura para o psicólogo. (revogada)

COFEN - Conselho Federal de Enfermagem: RESOLUÇÃO COFEN Nº. 326/2008 Resolução COFEN nº. 326/2008

CFM - Conselho Federal de Medicina: RESOLUÇÃO CFM Nº 1.666/2003 (RESOLUÇÃO CFM nº 1.455/95; Revogada pela Resolução CFM nº 1.634/2002)

Conselho Regional de Psicologia – São Paulo, CRP - SP. NOTA TÉCNICA Publicado em 11/5/2015 http://www.crpsp.org.br/portal/midia/fiquedeolho_ver.aspx?id=881


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domingo, 23 de setembro de 2018

Fígado, Raiva e Agressão na Medicina Tradicional Chinesa


É tentador buscar compreender as emoções em seu sentido mais amplo e universal, contudo numa perspectiva clínica da medicina psicossomática e mesmo para o entendimento correto (leia-se interpretação ocidental) da medicina tradicional chinesa alguns parâmetros deve ser considerados.

Colin A. Ronan em sua "História ilustrada da ciência da Universidade de Cambridge" assinala o período histórico de surgimento/consolidação de algumas das ideias básicas da ciência chinesa, como nos descreve, a concepção de Yin / Yang (陰陽) originou-se no princípio do século IV a.C. e quanto a teoria dos Cinco elementos Wu Xing (五行), ele atribui  sua sistematização e origem nos anos entre 370 e 250 a.C. por Tsou Yen (Zou Yan) o membro mais destacado da Academia Chi-Hsia (Zhi-Xia) do príncipe Hsuan (Xuan).

O reconhecimento da teoria dos "cinco elementos" ou "cinco movimentos" constitui-se como uma verdadeira revolução no conjunto de hipóteses, leis e teorias que formam a psicologia. Na concepção da tradição chinesa os sentimentos ou emoções organizam-se como um ciclo associado à atividade dos órgãos meridianos durante o dia e durante o ano. Tais emoções e sentimentos podem ser benéficos ou patógenos a depender da forma como associados aos cinco elementos da natureza (Vento; Calor; Umidade; Secura; Frio)

Observe-se, contudo que os ideogramas chineses que correspondem aos cinco sentimentos ou emoções poderiam ser melhor compreendidos, pelos ocidentais, analisando-se, numa perspectiva antropológica,e/ou  sua utilização na literatura chinesa clássica.

Para os ocidentais o ciclo neurofisiológico das emoções associado às estações do ano é em parte já reconhecido por especialistas em psicobiologia e estudo do comportamento animal. São considerados  matrizes ou modelos, replicados em seus diversos fatores em experimentos  que contribuíram para atual concepção da neurofisiologia das emoções.  Uma atenção especial é dada à agressão,  por sua associação ao crime, porque não à sociopatia sádica que começa a ser interpretada nesses modelos, e mesmo à guerra.   

Em psicologia as emoções vêm sendo estudadas desde sua origem como ciência.   Entre as primeiras proposições destacam-se as contribuições de William James (1842-1910) modificada posteriormente pelo fisiologista Carl Lange, nessa teoria, conhecida também como teoria da emoção de James-Lange,  imagina-se que as emoções ocorrem como resultado de reações fisiológicas aos eventos.

Na teoria proposta por  Walter Bradford Cannon (1871-1945), a emoção ocorre quando o tálamo envia sinais, ao mesmo tempo, para o sistema nervoso autônomo e para o córtex cerebral, o que produz simultaneamente a experiência da emoção e as alterações corporais.

Entre outras pode ser citada ainda  a teoria dos dois fatores de S. Schachter e J. Singer's (1962), segundo a qual a experiência da emoção depende da estimulação autônoma e da interpretação cognitiva dessa estimulação.

Outro destaque é a teoria psicanalítica, onde se utiliza o termo afeto (teoria dos afetos) para designar algumas das emoções estudadas por James e Cannon e Schachter com grandes contribuições  sobretudo à compreensão da ansiedade e tristeza (melancolia), especialmente a relação destas com as chamadas doenças psicossomáticas, como veremos, apesar de nos limitarmos, nesse texto, ao estudo da raiva e agressão.

Sem tanta pretensão com as da psicologia enquanto ciência, a maioria dos manuais de acupuntura traduzidos descrevem os seguintes sentimentos/emoções: (1) ira ou raiva ( nù); (2) alegria, felicidade ( xǐ ) também traduzido como surpresa susto; (3) ansiedade ( yōu) traduzido também como: preocupação – meditação – ficar pensativo ( - si); ter uma ideia fixa, obsessão; (4) tristeza traduzido também por: melancolia, sofrimento moral, mágoa ( bēi) e (5) medo ( kǒng).

Na concepção ocidental de medicina psicossomática de doença psicossomática a agressão e ou raiva pode estar associada à gastrite e à esofagite, à algumas formas de constipação ou prisão de ventre. Inclusive o termo “enfezado” sinônimo de irritado, zangado, na concepção popular e  em muitos dicionários "causar fezes a ou ser acometido de fezes;  contudo etimológicamente apenas associado  à irritação e não a fezes (do latim infensare, “ficar raivoso com”, “ser hostil.”). Se relacionarmos a raiva à modernas concepções dos mecanismos de fuga e luta e reação de stress além das ”clássicas” ulceras duodenais também está associado à distúrbios cardíacos, asma e outras doenças da emoção ansiosa ou depressiva nas suas fases de “alerta” e “exaustão” ou “quase –exaustão”.

Na concepção chinesa e teoria dos Cinco Elementos ou Movimentos a “raiva” está associada ao meridiano do fígado (Gan 肝經). Pela sua natureza ou função deste meridiano relaciona-se ao aumento do Qi (energia vital) necessários à reações de luta, o que elicia, tanto para ocidentais como orientais, o padrão reativo de ira: taquicardia, prontidão de músculos e articulações, o rosto e os olhos avermelhados, agitação. Os chineses aí identificam o chamado aumento fogo do fígado.

Entre as doenças associadas ao desequilíbrio das relações do fígado com  os meridianos do pulmão, baço estomago e intestino – descritos na teoria dos cinco elementos (五行, wŭ Xing) são conhecidas e tratadas empiricamente, lesões de cartilagem e unhas, afecções dos olhos e a capacidade de planejamento, projetos inspiração por afetar o hun – alma etérea (o fator cognitivo da experiência emocional ? ou a função do lobo – frontal ?) .

Uma síntese entre tais concepções e práticas decorrentes de seu emprego ainda está por ser realizada. Acreditamos que a correta interpretação dos elementos lingüísticos e culturais seja essencial. Não se deve esquecer, porém,  que tanto a concepção de doença como de cura em ambas as concepções devem ser consideradas simultaneamente (e não a descrição da doença para o ocidente e o tratamento oriental ou vice versa) e que assim como no ocidente a acupuntura e medicina chinesa é uma concepção que dialoga com resultados empíricos ou de experiência acumulada embora não se limite a tecer hipóteses com o que pode ser visto (observável) ou possua existência material, levando-se em conta a condição de espírito e não apenas a dimensão simbólica e de linguagem.

Referências

Ronan, Colin A. História Ilustrada da Ciência da Universidade de Cambridge. (4vol.) vol 2 - Oriente, Roma Idade Média. RJ, Zahar Ed, 1987

Weiten, W. Introdução à Psicologia: Temas e Variações. São Paulo: Pioneira Thomson, 2002

Reisenzein, R. (1983). The Schachter theory of emotion: Two decades later. Psychological Bulletin, 94(2), 239-264. 

Gurgel, Marina Gasparoto do Amaral. Raiva: emoção presente nos portadores de gastrite e esofagite. Psic,  São Paulo ,  v. 8, n. 2, p. 241-242, dez.  2007 .  acesso em  23  set.  2018.

Selye, Hans. Stress a Tensão da Vida. SP: Ibrasa, 1965

Maciocia, Giovanni. Os fundamentos da medicina chinesa. SP: Roca, 2015

Esse texto inclui também a revisão de contribuições e publicações do autor em:




Ideogramas

 Nù 激怒
exacerbation; enrage, infuriate, nettle, anger, thorn, pique, burn up, exacerbate

Cì Jī 刺激
stimulate, provoke, irritate, upset, motivate, motive
刺- - thorn
激- – Excited
……………………………………………………………………………….

Fèn Nù 憤怒
Fèn anger /  indiginação
 Nu angry / zangado

angry, indignant, raging; umbrage, rage, pique, teen, paddy, anger, wrath, outrage, huff, fury, vehemence, vehemency, bile, indignation;
……………………………………………………………………………….

Qīn Lüè 侵略

aggression, encroachment, foray, incursion, inroad, invasion; invade, intrude

Qīn invadir tomar
Lüè aos poucos

segunda-feira, 14 de maio de 2018

Psicologia, acupuntura e yoga


Texto equivalente à apresentação sobre a possibilidade de integração de práticas complementares à psicoterapia intitulada  "Psicologia, acupuntura e yoga, uma abordagem dos sistemas etnomédicos orientais e sua perspectiva de integração com a prática da psicoterapia" na Faculdade Metropolitana de Camaçari - FAMEC em 2018



A especificidade da medicina tradicional chinesa - MTC não torna essa prática essencialmente distinta de outros sistemas etnomédicos. Caracteriza-se na, tipologia de Arthur Kleinman (1941) para comparação de sistemas médicos como sistemas culturais, como um setor profissional que envolve uma formação sistemática dos seus representantes ou atores, distinguindo-se do setor folk (os curandeiros não profissionais) e do setor popular (de senso comum e conhecimento difundido na comunidade). [1]

A MTC distingue-se também, como foi tese do conhecido sinólogo de Cambrigde - Joseph Needham (1900-1995), por sua notável semelhança com a medicina hipocrática - a quem se atribui a origem da moderna medicina ocidental cosmopolita. O estudo etno-histórico destes distintos caminhos de desenvolvimento racional e tecnológico aos poucos vem sendo compreendido especialmente com a perspectiva de integração destes. [2]

A acupuntura médica e MTC

Enquanto campo de prática de saúde em diversas regiões do mundo inclusive na China e Brasil tanto sobrevivem os especialistas em medicina chinesa formados no processo convencional, que é a relação mestre discípulo associada ao estudo dos textos clássicos, como impõe-se uma tendência de associação da acupuntura às diversas especializações médicas e paramédicas com desempenho multiprofissional. Sendo que, no Brasil, há restrições quanto a prática de alguns segmentos profissionais, o que vem sendo feito de diversas formas pela classe médica (proibição jurídica, exclusão em cursos e congressos, difamação, etc.). A classe médica reivindica para si os direitos ao seu exercício enquanto especialidade profissional. Por sinal este reconhecimento no Brasil ocorreu décadas depois do reconhecimento por conselhos de fisioterapia e outras profissões. 

Acupuntura científica: biomedicina ou antropologia

Por outro lado, como já disse em outra publicação, tende-se a interpretar a acupuntura científica como acupuntura biomédica, como se as explicações desenvolvidas pelas ciências sociais não fossem uma explicação científica, ou que o entendimento dessa arte – técnica não requer a compreensão de seu contexto cultural, sua dimensão psicossocial e/ou espiritual. Ignorando-se também que o conhecimento oriental, “científico” ou não, por si só, foi suficiente, durante muito tempo, para permitir seu pleno domínio e utilização. [3]

Tornou-se um desafio para o praticante ocidental conciliar o amplo espectro de disciplinas requerido para entendimento (antropologia médica ou da saúde, etnologia, linguística, neurociência, etc.) desse novo campo do saber que se inaugurou com o nome de “acupuntura” (acupuntura multiprofissional) e mais especificamente a “acupuntura baseada em evidências” no ocidente. [4]

Apesar das dezenas de estudos clínicos comparados a outras formas de intervenção terapêutica e comparações de tais resultados em estudos de revisões sistemáticas e meta – análise, ainda não se descartou a rotulação de pseudociência por alguns segmentos retrógrados da comunidade científica que não compreendem as limitações dos estudos de caso-controle, duplo cego e comparação com placebo e/ou desconhecem a metodologia clínico - qualitativa.

Estudos da evidência do efeito da acupuntura visando identificar o volume de pesquisa sobre sua eficácia em revisões publicadas, identificou 183 revisões sistemáticas publicadas entre 2005 e 2014. A maioria da literatura secundária e pesquisa primária disponível referiam-se a clinica da dor, incluindo também artigos sobre a acupuntura e promoção do bem-estar, distúrbios mentais e efeitos adversos. Constatou-se que a literatura publicada disponível sobre acupuntura é extensa. Pesquisas no PubMed em 2013 identificaram quase 20.000 citações com o termo "acupuntura" e quase 1.500 ensaios clínicos randomizados (ECR) com "acupuntura" no título e, até mesmo uma série de “revisões de revisões” estão disponíveis na literatura publicada sobre acupuntura em geral ou para uma condição clínica específica. Contudo os resultados de revisões existentes sobre a eficácia da acupuntura não são conclusivos quanto a sua eficácia ou não eficácia, por exemplo: uma revisão sistemática de revisões sistemáticas da acupuntura publicada entre 1996 e 2005 incluiu 35 revisões, observando-se que apenas 18 avaliações reafirmam a eficácia da acupuntura (sendo que somente 6 com excelente qualidade de pesquisa). De um modo geral a base de evidências é heterogênea e os estudos de maior qualidade estão apenas começando a emergir, desde 2002. [8]

Um outro elemento ou critério de entendimento da dificuldade de interpretação dos efeitos ou eficácia terapêutica da acupuntura pela comunidade científica ocidental é o fato de que as interpretações dos achados (evidências) clínicos do efeito da acupuntura fundamentam-se num conjunto de teorias e princípios que ainda não possuem uma unidade ou coerência, acontecendo o mesmo com os parâmetros de uso de medicamentos da fitoterapia chinesa.

Entre os fundamentos teóricos advogados como referência incluem-se a teoria das comportas (Melzack, Wall, 1965), a teoria reflexos condicionados para inibição da dor, irritação (contra irritação) e diversas versões da reflexologia em regiões pontos específicos do corpo humano e animal. Incluem-se também teorias articulando psicologia do efeito placebo e das relações estímulo – resposta; as noções de terapêutica e clínica médica fundamentadas na neurofisiologia e bioquímica celular dos efeitos da inserção de agulhas, o efeito “farpa” associado à produção de endorfinas. [5] [6] [7]

Observe-se que para um ocidental necessariamente, a antropologia médica ou da saúde (a ciência, por excelência, da interpretação de outras culturas) não pode ser ignorada. Há de se vencer, portanto, a barreira das culturas (etno-histórica) e a multiplicidade de idiomas. O idioma (língua) segundo Matoso Camara Jr. apresenta-se como um microcosmo da cultura. Tudo que a cultura possui se expressa através da língua; e esta é em si mesma um produto cultural. Sem resolver tal paradoxo não há de se ter uma perfeita compreensão da cultura chinesa e de suas tradições.

O estudo da história da acupuntura na China revela seu rompimento com algumas tradições "mágicas", havia referências sobre sua proibição no final do período imperial Dinastia Qing (1822) quando foi excluída do Instituto Médico Imperial por decreto do Imperador. Apesar da proibição foi mantida como interesse acadêmico, costume e tradição, sobretudo nas áreas rurais ao ponto de ser novamente proibida (1929) durante a república, juntamente com outras formas de medicina tradicional por uma crescente ocidentalização ou adoção da medicina cosmopolita, sendo apenas restaurada e incentivada como prática na primeira metade do século XX durante a revolução cultural chinesa. [9]

De qualquer forma é incontestável, no âmbito da antropologia, a evidente incorporação do conhecimento empírico proveniente de cuidadosas observações ao logo de milênios de prática, que se consolidaram no que vem sendo chamado de paradigma do Yin - Yang e dos Cinco Elementos, descrito em livros clássicos, para os orientais, a exemplo do livro do Imperador Amarelo (consolidado durante a dinastia Han (206 a.C. – 220 d.C.), "documentos etnológicos brutos" para o ocidental que utiliza as ferramentas conceituais da antropologia estrutural na proposição de Levi Strauss (1908 - 2009) [10]

A história da antropologia da medicina se confunde com a própria história da antropologia. Tal como ocorreu nesta disciplina já houve uma predominância de perspectivas etnocêntricas e evolucionistas que devem ser evitadas. W. H. Rivers (1864-1922), um dos mais antigos pesquisadores da área e também médico, assinala por exemplo que algumas medicinas ditas primitivas são no plano teórico mais coerentemente organizadas que a medicina científica ocidental sobretudo no plano humano e espiritual ou natural e sobrenatural. [11]

Acupuntura & Psicoterapia

Com a utilização da antropologia é possível identificar na prática da acupuntura um modelo contextualizado no conjunto multi-étnico da Ásia ou das Medicinas Antigas, como inclusive já vem sendo feito. Por exemplo a partir da constatação da utilização do conceito de racionalidades médicas empregado por Madel Luz  analisando inicialmente a homeopatia e posteriormente a própria medicina chinesa  identificando nestes similaridades conceituais na resposta  destes grupo sociais às patologia que lhes afligem, alterações da energia vital e ambiente (miasmas) que denominou como paradigma vitalista.

Segundo esta autora uma racionalidade médica ou sistema lógico e  teoricamente estruturado, tem como condição necessária e  suficiente para ser considerado como tal, a presença dos  seguintes elementos: 1. Uma morfologia (concepção anatômica); 2.  Uma dinâmica vital  ( "fisiologia" );  3. Um sistema de  diagnósticos; 4. Um sistema de intervenções terapêuticas; 5. Uma  doutrina médica (cosmologia).

Não há dúvidas que a medicina tradicional chinesa preenche esses requisitos. Uma doutrina médica (cosmologia) descrita e re-escrita no Livro do Imperador Amarelo, uma concepção da mente na China, o Shen (神 , shén) indica a atividade de pensamento, consciência, auto - percepção, vida emocional, memória e vontade, todos os quais, na concepção chinesa, dependem do coração, assim como na medicina grega pré-hipocrática. Nas medicinas antigas são surpreendentemente notáveis a concepção de mente espírito, a exemplo dos escritos de  Patanjali (publicados aproximadamente entre 200 a.C. a 400 d.C.) na Índia e/ou as descrições da lógica por Aristóteles (384 a.C. - 322 a.C.) a quem se atribui 
a criação da lógica como disciplina, no século IV a.C. [12] [14]

Para Laplatine, o autor de “Antropologia da doença” (1991) a ciência estuda a percepção e elabora e analisa modelos etiológicos e terapêuticos, a acupuntura possui um modelo etiológico do tipo  Exógeno/Endógeno  comparável à Endocrinologia, Neuropsiquiatria e um modelo  terapêutico distinto da alopatia e homeopatia classificado num grupo tipo Sedativo/ Excitativo comparável à medicina experimental e à moderna fisiologia médica a exemplo das proposições terapêuticas da imunologia, "Treinamento Autógeno" de J. H. Schultz (1884 -1970) e Bioenergética de W. Reich (1897 - 1957) [13]


Uma outra contribuição relevante para a psicologia que ainda necessita ser melhor compreendida é a concepção de emoção. Os sentimentos ou emoções: Raiva (agressividade / 怒 nù) ; Alegria (喜 xǐ); Preocupação (ficar pensativo 想 - si / xiǎng); Tristeza (melancolia / mágoa 悲 bēi); Medo (恐 kǒng) / Apreensão/ ansiedade (忧 yōu), são considerados correspondentes ao fluxo da energia vital – Chi nos meridianos e órgãos tanto durante o ciclo sazonal correspondente às estações do ano, como aos ciclos circadianos (24 horas) e pequenos ciclos infradianos (12/24) denominados, por eles, a pequena e a grande circulação de energia.

Em psicologia o estudo das emoções vêm sendo realizado desde sua origem como ciência e ainda não chegou a um consenso. Entre as primeiras proposições destacam-se as contribuições de William James (1842-1910) e Walter Bradford Cannon (1871-1945); a teoria dos dois fatores de Stanley Schachter (1997) e Jerome E. Singer (1934–2010)  decerto contribuindo para as matrizes dos estudos que contribuíram para atual concepção de sistema límbico, e cérebro emocional. Somando-se também a teoria psicanalítica, onde se utiliza o termo afeto (teoria dos afetos) com grandes contribuições a uma possível aproximação ao entendimento das doenças psicossomáticas na ótica oriental com suas contribuições a dinâmica da energia sexual, ansiedade e tristeza (melancolia).

Além de diversas teorias e técnicas de meditação (influenciada ou unificadas entre a China Índia e Tibet pelo Budismo) encontramos na MTC estudos correspondentes à moderna Sexologia (Medicina/ Terapia Sexual) O conhecimento sobre a reprodução e sexualidade humana também se insere numa esfera que envolve a mitologia e/ou ciência oriental conhecidas no ocidente como tantra yoga ou taoísmo do sexo abrangendo desde norma de conduta a técnicas equivalentes as utilizada na psicoterapia das disfunções orgásmicas. [15]

A unidade da Ásia

Creio não haver dúvidas quanto as vantagens da abordagem da medicina tradicional chinesa (MTC) no conjunto asiático (grego asiático) – Medicinas Antigas bem como os sistemas médicos tradicionais do Japão, da Coréia, da Índia e Tibete que formam a nossa concepção ocidental de "Medicina Oriental". Observe-se também, como assinala Corral, a Medicina Tradicional Oriental não é somente uma medicina e sim uma tradição minuciosamente transmitida através de conceitos universais do lugar existencial do homem. Suas remotas origens de mais de 5.000 anos, antecedem a concepção de “China” (中国) e podem ser consideradas pertencentes a todo oriente. [16]

Algumas diferenças básicas, entretanto podem ser assinaladas quanto ao seu desenvolvimento e características atuais. Da medicina grega (hipocrática), comparável a MTC por Needham, como visto, pouco restou de suas noções de água, fogo, terra e ar, além de sua aplicação a biotipologia humana e algumas concepções do processo saúde doença mental tais como as concepções de “melancolia” “histeria” e “paranóia” e outras noções sobre febre e energia vital conservadas pela então denominada naturopatia.  Por outro lado entre a medicina chinesa e indiana ainda conservam notáveis característica que evidenciam a dispersão e sua origem comum ou frequente contatos inter-étnicos como assinalam os antropólogos.

Uma característica importante quanto a sua incorporação/integração à cultura ocidental pode ser deduzida da forma com tais práticas chegaram ao ocidente no século XX. A acupuntura via saúde publica, com recomendações da Organização Mundial de Saúde  após a revolução cultural chinesa que a integrou à atenção primária no modelo de agentes comunitários de saúde – os conhecidos “médicos de pés descalços” atualmente conhecidos médicos rurais (village doctors) e o Yoga chegou até nós via escolas de hatha-yoga e centros de meditação inseridos na cultura espiritualista e da educação física. Ainda hoje ainda não há uma integração plena dos diversos aspectos dessas contribuições indianas. A shantala, as diversas modalidades de  yoga (tantra, raja, kria, ashtanga, hatha, etc.) são pouco conhecidas quanto a integração ao sistema que pode ser denominado com a medicina Iajurveda de origem.  [17]

A prática do yoga ou yôga no ocidente, principalmente, depende de instrutores formados em cursos de formação de Instrutores com certificado e regulamentação profissional em órgãos específicos a exemplo Federação Portuguesa de Yoga, (F.P.Y.) que constituiu-se como pessoa colectiva de direito privado sob a forma de associação destinada a promover, desenvolver, regulamentar, formar, dirigir e divulgar a prática do Yoga, em suas diversas modalidades e filosofias bem como promover e regulamentar a formação de professores de Yoga

Apesar das diversas publicações e proposições de yoga como terapia o  instrutor de yoga regulamentado no Brasil segundo De Rose 1992 desde  a década de 60 como professor de educação física especializado secretaria de Educação do Estado da Guanabara.

O yoga é uma filosofia prática de vida que objetiva transformações ou modificações da consciência, ou samádhi. Implica no estudo e treinamento de aproximadamente 108 grupos de ásana, cujo aprendizado implica em 225 horas-aula, com acompanhamento de instrutores formados e revalidados, 300 horas mínimas de práticas completas de Yôga, (sádhana) e 2000 horas mínimas de estágio monitorado em escolas reconhecidas.

Atualmente é consensual a noção de que o yoga não é nenhum tipo de ginástica nem modalidade alguma de Educação Física, compreende técnicas corporais, bioenergéticas, emocionais, mentais, com algumas que não podem sequer ser ensinados por livros, e são considerados secretos apreendidos em ritos de iniciação associados ao domínio da meditação, e prática corporal, enfim é uma forma de terapia que faz parte da medicina Ayurveda. [18] [19] [20]

No Brasil a acupuntura está regulamentada pela portaria nº 971 que aprovou a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) no Sistema Único de Saúde em 3 de maio de 2006, admitida no SUS como prática multiprofissional.  A medicina ayurvédica, a  shantala e yoga foram somente foram anexados às práticas do SUS, através portaria  849/2017 que anexou 14 novos procedimentos à Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PICs) do SUS .

A integração das práticas da acupuntura associadas ao sistema indiano de chakras e meditação, como vem sendo proposto no ocidente, apesar de diversos livros e artigos publicados, ainda pode ser considerado experimental. Existem proposições tanto de integrar a pratica da acupuntura a meditação (inclusive há diversas escolas de meditação taoista, budista e exercícios chineses) como de realizar agulhamento, estimulação física na região dos chakras interpretando estes como plexos nervosos e sistemas integrados de regulação hormonal e comportamento. [22] [23]

Contudo, como dito, ainda não existe uma aprovação consensual ou reconhecimento de grande parte da comunidade científica. Aguarda-se talvez um acúmulo maior de explicações imperfeitas e teorias falhas, o que na ótica de Thomas Kuhn, (1962) é o limite de mudança de paradigmas. As anomalias - quer dizer, a incapacidade de dar conta dos fenômenos observados, induzirão ao surgimento de novas teorias que podem vir a lograr êxito, unificar-se e solidificar-se como pratica dos integrantes da comunidade cientifica de que fazem parte, o que findará por substituir o anterior. Sendo assim uma mudança de paradigma no processo de constitui as revoluções científicas. [24]

Algumas referências

1. KLEINMAN, Arthur Concepts and a Model for the comparison of Medical Systems as Cultural Systems. IN: CURRER,C e STACEY,M / Concepts of Health, Illness and Disease. A Comparative Perspective, Leomaington 1986

2. NEEDHAM, Joseph; Gwei-Djen, Lu. Celestial lancets a history and rationale of acupuncture and moxa. USA, Cambridge University Press, 1980

3. COSTA, Paulo Pedro P. R. Acupuntura científica uma reflexão. Acupuntura Ciência & Profissão. abril de 2012
http://etnomedicina.blogspot.com.br/2012/04/tende-se-interpretar-acupuntura.html

4. ROSSETTO, Suzete Coló. Acupuntura Multidisciplinar. SP, Editora Phorte, 2012

5. MELZAC, Ronald. A percepção da dor. Scientific American, Fev.,1961 in MAcGaug. J.L.; Weinberger, N.M.; Whalen (org) Psicobiologia, as bases biológicas do comportamento, Textos do Scientific American. trad Aratangy, L. SP Polígno, 1970

6. DUMITRESCU, Ioan Florin. Acupuntura científica moderna. SP, Andrei, 1996

7. PETTI, F; BANGRAZI, A; LIGUORI, A; REALE, G; IPPOLITI, F. Effects of acupuncture on immune response related to opioid-like peptides. Journal of traditional Chinese medicine V18. N 1, March, 1998, (Abstract, http://europepmc.org/abstract/MED/10437265 Acesso maio de 2018)

8. HEMPEL S, TAYLOR SL, SOLLOWAY MR, et al. Evidence Map of Acupuncture [Internet]. Washington (DC): Department of Veterans Affairs (US); 2014 Jan. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK185072/

9. WHITE, A.; Ernst, E. A brief history of acupuncture. Rheumatology 2004;43:662–663 doi:10.1093/rheumatology/keg005

10. LÉVI-STRAUSSLevi-Strauss, Claude. Pensamento Selvagem SP, Cia Ed Nacional, 1976

11. QUEIROZ, Marcos de Souza; CANESQUI, Ana Maria. Antropologia da medicina: uma revisão teórica. Rev. Saúde Pública,  São Paulo ,  v. 20, n. 2, p. 152-164,  Apr.  1986 .   Available from . access on  14  May  2018. 

12. MACIOCIA, G. Shen and hun: psyche, in, chinese medicine. http://maciociaonline.blogspot.com.br/2012/11/shen-and-hun-psyche-in-chinese-medicine.html Aces. Maio de 2018

13. LAPLATINE, François. Antropologia da Doença. SP, Martins Fontes, 1991

14. ELIADE, Mircéia. Patanjali e o yoga. Lisboa: Relógio d’água, 2000

15. COSTA, Paulo Pedro P. R. Kama Sutra & Tantra Yoga uma análise a partir da sexologia, psicanálise. https://pt.scribd.com/doc/24375517/KAMA-SUTRA

16. CORRAL, José Luis Padilla. Fundamentos da medicina tradicional oriental: Curso de acupuntura. SP, Roca, 2006

17. Hu D, Zhu W, Fu Y, et al. Development of village doctors in China: financial compensation and health system support. International Journal for Equity in Health. 2017;16:9. doi:10.1186/s12939-016-0505-7.

18. DE ROSE Yoga - Mitos E Verdades. SP, Nobel, 1992 Disponível no Google Livros Maio, 2011

 19. HERMÓGENES, José. Yoga para nervosos. RJ: Record, 1969.

 20. ELIADE, Mircea. Yoga, imortalidade e liberdade. SP: Palas Athena, 1996

21. FRAWLEY, D. Ayurveda and the mind. Twin Lakes, Wis.,Lotus Press, 1996 apud: FEUERSTEIN, Georg. A tradição do yoga, história, literatura, filosofia e prática. SP, Pensamento - Cultrix, 2006

22. STUX, Gabriel M.D. Acupuntura de chakra (Tradução: COSTA Paulo Pedro P. R.) Acupuntura Ciência & Profissão. 20 de junho de 2013 http://etnomedicina.blogspot.com.br/2013/06/acupuntura-de-chakra.html

23. CROSS John R. Acupuntura e o sistema de energia dos chakras SP: Manole, 2017

24. KUHN, Thomas. Estrutura das revoluções científicas. São Paulo: Perspectiva, 1978