terça-feira, 12 de dezembro de 2017

Acupuntura, mente-espírito e estados fásicos da consciência


Este texto foi adaptado de um capítulo da monografia de especialização em acupuntura intitulado “O mar de dentro, um estudo da concepção de cérebro, mente e espírito no sistema etnomédico chinês”, orientado pelo biofísico e acupunturista Prof. Jurecê Machado no curso de formação que ministrava, vinculado a Associação Brasileira de Acupuntura - seção da Bahia, inaugurada por Dr Heackel Mayer. Elabora uma revisão das referências às antigas descrições do “mar de medula”, relacionando este órgão que corresponde a concepção chinesa de cérebro, às modernas aplicações da acupuntura nas doenças nervosas (neurológicas, psiquiátricas ou psicológicas e psicossomáticas).

O presente objetivo é a descrição da concepção tradicional chinesa de mente ou consciência, enquanto função que permite o pleno domínio das emoções e adaptação do indivíduo a seu ambiente - a longevidade numa perspectiva materialista e a imortalidade numa concepção espiritualista, dedutível pelo uso de um mesmo ideograma (shén) para mente e espírito como veremos.

O exercício de algumas das diversas técnicas de concentração e domínio da atenção ou meditação, que conhecemos aqui no ocidente, tem origem no Taoísmo, no Budismo, nas religiões tibetanas, e no Hatha Yoga indiano. Podem ser descritas como técnicas  psicofisiológicas análogas, e são delas derivadas. Dispensam apresentação, por exemplo, as conhecidas técnicas de relaxamento progressivo e treinamento autógeno de Edmund Jacobson (1888-1983) e Johannes Heinrich Schultz (1884-1970) onde está implícito reconhecimento da neurofisiologia ou função cerebral da "consciência", nestes exercícios e função que ocupa uma posição central na neuropsiquiatria ocidental.

O interesse especial do estudo neurofisiológico da acupuntura em estender-se às técnicas taoístas, também designadas como alquímicas (da alquimia chinesa), não é apenas pelo exercício e rigor de uma abordagem antropológica que explora a unidade e diferenciação étnica dos povos asiáticos. Segue a clássica recomendação maussiana [2] de análise do “fato social total”  ou seja a recomendação de que um estudo não deve limitar-se a comparação de um item isolado ou um só aspecto de uma cultura.

Pode-se afirmar que o maior interesse da acupuntura nesta seara da neurociência é decifrar o enigmático conceito e ideograma do Shen que tanto pode ser entendido como espírito como por mente – consciência, ligado ao coração. Um dos cinco aspectos mentais juntamente com o Hun (alma etérea), o Po (alma corpórea) pertencente ao pulmão; Yi (intenção, tendência) e o Zhi (memória) ligado ao rim e jing ancestral e à própria mente (Shen). [3] Nesse texto nos ocuparemos do Shen comparando-o com as possíveis interpretações da neurofisiologia ocidental e concepções indianas das descrições de Patanjali.

Observe-se que nesta descrição está o modelo de mente-consciência como função que regula o corpo (Po - alma corpórea), permite a imortalidade (Hun -alma etérea) constituindo os desejos conscientes e tendências (Yi – intelecto) e a memória e a aspiração (instinto de sobrevivência) ou o shen – substância mental. Exploramos a relação desta com as emoções, meridianos e cérebro (o mar de medula) em um outro artigo sobre tal concepção abstrata de aplicações clínicas que é o objeto de nossa tese. No momento interessa-nos apenas o entendimento do shen enquanto representação do que entendemos por espírito – mente – consciência.

Como dito algumas das "modernas" técnicas de intervenção no tônus muscular e controle da tensão nervosa tem origem oriental e foram efetivamente incorporadas à medicina ocidental (neuropsiquiatria), com os nomes de: auto-hipnose, hipnose, treinamento autógeno, técnicas de relaxamento progressivo. Entre as formas de interpretação de tais efeitos ainda se utiliza o referencial teórico da neurofisiologia russa (pavloviana) sobre atividade nervosa superior, estados de fase e a consciência, [4, 5]  Embora grandes avanços se registrem no que atualmente designamos por funções executivas; “atividade da rede neural de modo padrão” (DMN Default Mode Network); [6] ou mesmo na própria neurofisiologia russa que relaciona os mecanismos da atenção (a unidade do tono, vigília e estados mentais) aos sistemas de assimilação - processamento (unidade de receber, analisar e processar informações) e execução de ações (unidade de programar, regular e verificar atividades), as três unidades funcionai propostas por A. R. Luria (1903-1978) para descrição da organização cerebral das atividades mentais. [7]

Contudo neste texto interessa nos o registro de que são essencialmente semelhantes: as descrições orientais (chinesas e indianas) de consciência e suas variações, e as  descrições ocidentais da consciência (atividade nervosa superior) e seus estados fásicos, detectáveis no eletroencefalograma. A consciência compreendida como frequência de ondas presentes entre a vigília e o sono, a saber: o estado de alerta; o estado alfa; o sono com sonhos (REM - Rapid Eyes Movement), o sono sem sonhos NREM (Non-Rapid Eyes Movement) e o estupor - coma.




Uma diferença básica entre essas concepções é observada quanto a diferenciação dos graus de estupor e coma (escala Glasgow) no ocidente. Alguns autores distinguem ainda os estados de letargia, também semelhante à estado homônimo obtido por hipnose e anestesia ou, se forem mais graves, obnubilação (pré comatosa).  Ainda se pesquisa a existência ou desenvolvimento de estados metabólicos semelhantes à hibernação e/ou a crença na vida sem batimentos cardíacos e respiração nos estados catalépticos dos yogues e faquires no oriente. Pouco se sabe também sobre os estados de delírio, consciência alterada e ampliada.

Esta constatação nos situa então diante de dois grandes problemas que apenas a metodologia etnohistórica não parece ser suficiente (1) a comparação de crenças ou sistemas etnomédicos orientais (asiáticos) e (2) a comparação destes com pesquisas e teorias da medicina cosmopolita ocidental.

Segundo Tierra especialista em medicina oriental e tradutor de "Tao e Dharma" de Robert Svoboda e Arnie Lade, [8] um livro que explora as semelhanças e diferenças entre a medicina chinesa e ayurvedica, a distinção entre esses sistemas foi acentuado pelo modo como foram incorporados ao ocidente nas décadas de 70 e 80. Para acupuntura, onde se caracteriza uma abordagem físico-materialista houve um esforço desde a China para adaptar esta ao materialismo comunista chinês enquanto que a medicina ayurvédica acompanhou a trajetória da Yoga indiana acolhida pela filosofia espiritualista.

Svoboda e Lade apontam o uso do conceito de energia vital como principal elemento unificador e destacam a difusão do Budismo como elemento facilitador do intercâmbio entre esses sistemas reconhecendo porém o caráter empírico e particular de cada sistema.

Por outro lado, numa perspectiva  da integração do conhecimento produzido na cultura chinesa à atual medicina cosmopolita, apenas se inicia o interesse ocidental de psiquiatras (psicanalistas) por essa corrente mítico – religiosa. Na década de 1930 houve a tradução e comentário do “Segredo da Flor de Ouro” por Richard Wilhelm (1873-1930) e Carl Gustav Jung (1875-1961) e mais recentemente Alan Watts (1915-1973) escreveu o livro ”Psicoterapia oriental e ocidental” numa retomada deste interesse na década de 70. Pode-se dizer que houve também uma incorporação e difusão da acupuntura distinta da abordagem médica, físico-materialista, contudo também não plenamente aceita como científica, a contragosto dos representantes da psicologia analítica e contracultura com suas medicinas alternativas.

Segundo Jung é nesse importante texto, “A Flor do Ouro” que encontramos uma clara reflexão sobre a consciência, no seu sentido mais amplo e profundo incluindo as paixões, exigências instintivas  e o caminho ou forma de libertação dos opostos, segundo ele, comparáveis à psicoterapia ocidental (individuação). Atribui a esse livro (O segredo da Flor de Ouro) e ao Livro Tibetano dos Mortos (Bardo Thödol) seu interesse e compreensão da alquimia (européia) como um caminho de auto – conhecimento.  [9]

A descrição oriental detalhada do espírito, (o que inclui as formas de pensamento e controle corporal) e do processo em que a alma se separa do corpo, são os objetos desse saber. Para Jung assim deve ser interpretado o texto tibetano utilizado em rito fúnebre da grande libertação no Tibet - o Bardo Thodol que significa literalmente a  libertação pelo entendimento da vida após a morte..

A avaliação das possibilidades de perceber e conhecer o Eu verdadeiro independente dos condicionamentos dos órgãos dos sentidos, hábitos de raciocínio e os conjuntos de arquétipos e complexos de idéias do universo da psique são claramente detalhados nos textos orientais e ainda segundo o autor de uma psicologia do oriente e ocidente, excepcionalmente úteis para compreender os fenômenos de alteração da consciência, o sofrimento da psicose e transtornos mentais. 

Contudo os textos orientais ainda nos parecerão enigmáticos se vistos apenas como mítico – religiosos, embora nos obriguem a pensar sobre a realidade de sua aplicação à prática clínica.  As técnicas do yoga e acupuntura, por exemplo são utilizadas a milhares de anos e naturalmente houve um acumulo de experiência empíricas, conhecimento, que talvez provenham unicamente dessas experiências (?) como querem os cientistas apegados ao paradigma do materialismo científico.

a sabedoria da racionalidade mítica

Observe-se que a distinção entre mito e ciência, analisados á luz da antropologia estrutural, se realiza a partir de sua fundamentação na percepção (ciência ocidental) e na introspecção (mito) segundo Levi Strauss em seu clássico  Pensamento Selvagem.

Em nossa revisão, vale registrar, encontramos este fragmento de texto abaixo citado, que traz uma outra interessante coincidência, trata-se da descrição do método da introspecção utilizado no pensamento “mítico” chinês. No caso utilizado para "observar-se" e conhecer a mente ou shen - o espírito que comanda o hsing (corpo).

Lê-se no “livro do imperador amarelo”, o mais antigo compêndio da medicina tradicional chinesa:

"O shen não pode ser escutado com o ouvido, o olho deve ser brilhante de percepção e o coração deve ser aberto e atento para que o espírito se revele subitamente através da própria consciência de cada um. Não se pode exprimir pela boca; só o coração sabe exprimir tudo quanto pode ser observado. Se presta muita atenção, pode-se ficar a saber subitamente, mas também pode-se perder de repente esse saber. Mas shen, o espírito, torna-se claro par o homem como se o vento tivesse varrido as nuvens. Por isso se fala dele como do espírito." 

Observe-se a semelhança com as técnicas de meditação e auto observação que, como comenta Eliade, conduziu ao desenvolvimento de uma psicologia na Índia, que reconhece pelo menos quatro estados de consciência: a diurna; a dos sonhos; a do sono sem sonhos; e a cataléptica; experimentadas racionalmente por exercícios respiratórios e de atenção que permitem o acesso lúcido a cada um desses estados correspondentes a uma freqüência respiratória.

Sem as medidas do eletroencefalograma os indianos (e talvez os chineses) identificaram e tem propostas de intervenção nos fenômenos bio-elétricos mapeados por esse aparelho, inclusive dos estados de anestesia (ondas teta e delta), não mencionados por Eliade mas conhecido por faquires com suas técnicas de meditação e acupunturistas com suas agulhas e ervas.  

Observe-se porém que a concepção chinesa envolve cinco aspectos distintos da concepção indiana e pavloviana de estados fásicos, mas também se adéqua à prática das técnicas de meditação, embora explore o controle das regulações orgânicas (e existência extra corpórea) distinguindo alma etérea e corpórea (Hun e o Po) e os diversos aspectos ou qualidades do Chi, a esfera dos desejos (Yi reflexão) e a memória e força de vontade (Zhi). Um modelo sem dúvida mais complexo, mas ainda por ser decifrado em comparações étnicas e neuroantropológicas que articulem as emoções e a regulação orgânica.

Os exercícios de meditação relativamente semelhantes ao que conhecemos como técnicas de treinamento autógeno que são conhecidos e amplamente divulgados com dezenas de variações em escolas indianas, chinesas e tibetanas precisam ser devidamente estudados na ótica de uma possível etnopsiquiatria ou neuroantropologia.

a essência, o corpo e a mente

Os chineses concebem o homem como um microcosmo, o homem  é um elemento de conjunção dos pares contrapostos, Céu - Homem – Terra, que constituem os 3 principais elementos do mundo, o eixo yin / yang dos San Tsai (Tan T'ien). Essa imagem segundo Jung é uma representação antiqüíssima  que de uma forma semelhante em diversas regiões, cita como exemplo o mito africano ocidental de Obatala e Odudua (Céu e Terra) pais primordiais, que jazem em uma cabaça até que um filho, o homem surge entre eles.

O homem tal como um microcosmos, encerra a conjugação em si próprio dos contrastes e da dualidade. A tarefa de libertação no pondo de vista oriental e da psicoterapia ou individuação na proposição Jungniana é compreender este processo ou sua origem.  Ambas concepções se constituem como caminhos de trazer calma e paz de espírito, (harmonia com o Tao) condição essencial para manutenção e recuperação da  saúde.

Acupuntura requer portanto o conhecimento e concepção de espírito? O Shen referido, denota um aspecto imaterial do ser - o espírito, equivalente à psique? A mente ou psique é um instrumento de transformação de símbolos - a energia psíquica. Na concepção jungniana das técnicas de meditação/libertação.

Numa concepção mais restrita a expressão Shen (às vezes traduzido por espírito e as vezes por sentimento) designa a manifestação exterior da vitalidade do corpo e em um sentido estrito representa a consciência que comanda o Coração e atividade mental. Esta compreensão está associada no referido sistema conceitual dos San Tsai (Tan T'ien) ao Jing (traduzido como essência ou Chi ancestral) que corresponde ao meridiano, e funções do rim na acupuntura e também o que os indianos conhecem como "karma" e nós (ocidentais) como determinação genética, na medida em que descreve nossa vitalidade como potencial herdado. O Qi, na acupuntura assume muitas formas ou significados condizentes com a função que exerce em cada momento.

O diagrama, abaixo referido,  mostra a relação entre o Shen, Jing e órgãos responsáveis pela assimilação e distribuição da energia Qi do ar e alimentos.  O Tien é o princípio cósmico imaterial; Qi, “ a raiz do homem”, (seu ideograma pode ser decomposto em grão de arroz e vapor) e Jing é a energia ancestral que se conserva no meridiano dos rins.


O Qi circula em um fluxo interno, transforma a essência do alento e a energia espiritual (shen). Atravessa os campos de transformação os 3 (san) jiao: shang Jiao (alto - suspender);  zhong Jiao (meio) e  Xia Jiao (baixo inferior) conforme a Doutrina Médica Chinesa, segundo o Huangdi Neijing obedecendo as leis as leis do  Yin/Yang e dos 5 elementos.



o espírito e o coração

Como é amplamente conhecido um grande numero de povos, inclusive nas nossas concepções populares e cristãs, atribui-se os sentimentos e algumas funções da mente ao coração. Segundo as antigas teorias expressas por exemplo no Ling Shu (parte integrante do livro do imperador amarelo) é o coração que “reúne o espírito”. O coração comanda vasos e encerra o pulso e o pulso é a morada do Shen. O ponto que localiza-se nessa região do braço correspondente ao meridiano do coração chama-se Porta do espírito (Shen Men)

Na pratica da acupuntura, talvez numa dimensão não apensas simbólica, mas exercida com o uso de agulhas em pontos específicos ... acalmar o coração é uma forma de acalmar o espírito.

Sabemos entretanto que textos mais recentes do sec. XVI e XVIII  já reconhecem como do cérebro as funções da memória e inteligência e percepções decorrentes dos órgãos dos sentidos. Na época Ming, Li Zhi Zhen (1518-1593) afirmava que o "cérebro" é a morada do Shen original (Yuan Shen) ou espírito.

 Essa "descoberta" porém não constituiu uma contradição às tradições que também afirmava que o espírito e o cérebro estão unidos pelo sangue ("O Qi empurra o sangue (Xue). O sangue nutre o Qi").  Além do que como pode ser constatado em qualquer manual de acupuntura moderno existem estratégias de diagnóstico e tratamento com agulhas, moxabustão e ervas medicinais para as diversas patologias neurológicas, psiquiátricas ou psicológicas e psicossomáticas diagnosticadas como doenças nervosas no ocidente desde a evolução da medicina hipocrática (a quem se atribui a descoberta da relação entre o cérebro e a mente) em direção a medicina ocidental cosmopolita.

Entre as primeiras iniciativas de integração da medicina tradicional chinesa com a medicina ocidental deve-se destacar as contribuições da Revolução Cultural e Ministério da Saúde Pública da República Popular da China, propondo estrategicamente a criação de profissionais de nível médio versados em medicina tradicional chinesa e saúde pública, denominados Médicos de Pés Descalços e principalmente um caminho para sua formação onde se destaca a revisão do ensino da acupuntura. Foi elaborado o “livro dos quatro institutos” uma reunião das diversas tendências e escolas de acupuntura (Escola de Medicina Tradicional Chinesa de Beijing; Escola de Medicina Tradicional Chinesa de Shanghai; Escola de Medicina Tradicional Chinesa de Nanjing; Academia de Medicina Tradicional Chinesa).

Um livro que também re-apresentou a acupuntura ao ocidente e já incluía as concepções de patologias do ocidente, em nosso caso a histeria, distúrbios mentais depressivos e maníacos além de diversos sinais e sintomas de doenças neurológicas e psicossomáticas tipo insônia, ansiedade, impotência, ejaculação precoce, enurese noturna etc.

Não se deve esquecer também que os chineses antigos já reconheciam o órgão cérebro (mar de medula) e lhe atribuíam funções próximas das modernas concepções. Lê-se no Ling Shu: ..." o mar da medula em excesso significa um relaxamento muscular que ultrapassa a medida"... O que pode muito bem ser referências ao coma, estupor ou paralisia flácida numa escala de gradações do relaxamento e ..."o mar de medula em insuficiência provoca zumbidos de ouvidos com atordoamento do “cérebro” (vertigens). Observa-se dores intensas nas pernas, vertigens e perturbações na vista. O relaxamento incita ao sono"...

Enigmáticas entretanto continuam as relações entre este órgão e a mente, tanto para os gregos tal como evidenciam as divergências entre Hipocrates (460 – 370 a.C.) e Aristóteles  (384-322 a.C.) como para a moderna neurociência que ainda se vale de distintos modelos (a exemplo dos citados acima derivados da concepção pavloviana) utilizados nas distintas especialidades médicas (neurologia, endocrinologia, psiquiatria, anestesia, fisiatria, foniatria) e paramédicas (psicologia, fisioterapia, fonoaudiologia etc.) entre as quais está se inserindo o profissional de acupuntura.

Para alguns patologias autores modernos tem pesquisado equivalências aos desequilíbrios e agravos descritos na medicina chinesa antiga (a exemplo da síndrome dian kuang considerando a forma de classificação das emoções, (ética de relações interpessoais), a mente - espírito e o comportamento adequado (inclusive dietético) nas diversas estações do ano, um equilíbrio entre fatores internos e externos como se aprende nos ensinos de Huang di, o “Imperador Amarelo em dialogo com seu médico e aprendiz Qi Po.



Referências

1 COSTA Paulo Pedro P. R. O "mar de dentro" um estudo da concepção de cérebro, mente e espírito no sistema etnomédico chinês. Monografia para conclusão do Curso de Acupuntura Sistêmica e Auriculoterapia na Escola Científica de Acupuntura - CLIMA
filiada à Associação Brasileira de Acupuntura seção Bahia  tendo como Orientador: Prof. Jurecê J. Machado. Salvador,  julho de 2000

2 MAUSS Marcel. Sociologia e antropologia. SP: Cosac Naiify, 2003

3 MACIOCIA, Giovanni. Os fundamentos da medicina chinesa. SP: Roca, 2015

4 PAVLOV, Ivan P. O problema do sono (1935) in: PAVLOV, Ivan P. Reflexos condicionados e inibições. RJ: Zahar, 1972

5 ASTRUP, Christian. Psiquiatria pavloviana, a reflexologia atual na prática psiquiátrica. RJ: Atheneu, 1979

6 RAICHLE, Marcus E. A energia escura do cérebro. Scientific American Brasil, Edição especial neurociência 1; (26-31), fevereiro – março de 2014. São Paulo

7 LURIA, Aleksandr R. Fundamentos de neuropsicologia. RJ: Livros Técnicos e Científicos. SP: EDUSP, 1981

8 SVOBODA, R; LADE, A. Tao e Dharma, medicina chinesa e ayurveda. SP: Pensamento, 1998

9 JUNG, Carl G. Psicologia e religião oriental. RJ: Zahar, 1986

10 ELIADE, Mircea. Yoga: imortalidade e liberdade. SP, Palas Athena, 1996

11 ELIADE, Mircea. Patañjali e o Yoga. Lisboa: Relógio d’água, 2000

12  WANG, Bing Princípios de Medicina Interna do Imperador Amarelo (Dinastia Tang – Edição bilíngue). SP, Ed Ícone, 2001

ver também

NEI CHING, O livro de ouro da medicina chinesa, RJ, objetiva. reedição da primeira tradução para língua portuguesa publicado por Editora Minerva, Pt, 1940

LING – SHU, Base da acupuntura da medicina tradicional chinesa. Tradução e comentários de Ming Wong. SP, Andrei, 1995

JUNG, C. G. Tipos Psicológicos. RJ: Zahar, 1974

JUNG, C.G. O segredo da flor do ouro, um livro de vida chinês. RJ, Vozes, 1992

LEVI-STRAUSS, C. O Pensamento Selvagem São Paulo, Companhia Ed Nacional, 1976

LEVI-STRAUSS, C. A Natureza do Pensamento Mítico, IN: A Oleira Ciumenta São Paulo, Ed Brasiliense, 1986

MAIESE, Kenneth. Visão geral de coma e consciência prejudicada. Manuais MSD / Merk. https://www.msdmanuals.com (acesso em Junho de 2018)

WATTS Alan W. Psicoterapia oriental e ocidental. RJ, Record, 1972


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quarta-feira, 9 de agosto de 2017

A criação de Pan Gu

盘古开天辟地



 No princípio havia o não-ser, a insondável nuvem sem forma. O céu e a terra estavam em um mesmo e único não - lugar. Assim como tudo, não tinham nome, pode-se dizer que o que existia era o caos,  混 乱 o ovo cósmico 盘古, Tai Chi , a grande energia,  o  Tao.

O Tao em seu movimento gerou o Um. O Um gerou o Dois. O Dois gera o três e logo depois toda a escuridão. O ser que existia, então, toma a forma de um homem chamado Pan Gu 盘古. O trabalho desse homem é separar o leve, rosa-claro e brilhante (Yang ), do denso, escuro e pesado (Yin  ). Assim, Pan Gu começou a separar o céu da terra.

Para fazer seu trabalho, Pan Gu crescia empurrando o céu 天空 com a sua cabeça, pisando no chão com os seus pés. Esse esforço foi a sua vida .

Exaurido, deitou-se sobre si mesmo formando a terra; seu olho esquerdo brilhou e nasceu o Sol e, do olho direito nasceu a Lua 月亮. Seu fôlego expandiu-se em forma de vento 风 e sua voz ressoou em trovão.

Dos seus pés e cabeça, formou-se o Himalaia e todas as outras cadeias de montanhas; de seus ossos e dentes espalhados pela água , ao secar formaram-se as minas e os metais . A medula branca, líquidos cristalinos e outras gorduras, junto com o sangue , ao separar-se originaram os rios e mares.

A sua pele , tendões, os seus pelos e unhas transformaram-se na madeira , e o manto da vegetação foi cobrindo toda a terra, em sua primeira primavera. Os músculos pulsantes e artérias deram forma ao fogo dos vulcões e ao calor da terra envolvida em sua neblina com chuvas 雨.

No seu corpo, porém, havia pequenos seres que dele viviam, exatamente desses parasitas de energia formou-se o pequeno homem . Esse que povoou o mundo, junto com todos os dez mil seres que, sucessivamente foram nascendo uns dos outros feito a madeira que se incendeia em fogo, gera a terra, onde está o metal que cava a água que alimenta a madeira.

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Referências

Abreu, Antonio D. (Editor). Mitologia chinesa [Mitologia Primitiva], Quatro mil anos de história através das lendas e dos mitos chineses. SP: Landy, 2000

Pangu Separates the Sky from the Earth http://www.chinavista.com (2003)


Pan Gu, Chinese mythology.  Britannica.com https://www.britannica.com/topic/Pan-Gu (2017)

Ilustr. Arthur Lidov’s Medical Landscapes

Adapatação do mito: Costa, Paulo Pedro P. R. publicado originalmente
Verbo, poemas. BA: HarpDan; FazCultura, 2003

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

Resenha: A Histeria de Katharina de Freud Tratada com Acupuntura



Este livro de 224 páginas, que paradoxalmente aborda um caso clínico de “histeria” na ótica ocidental e oriental, abrange um verdadeiro abismo conceitual entre dois universos de teorias e tradições, uma patologia já descrita na medicina hipocrática associada ao útero (do grego: “hystera” que em chinês é 子宫 Zǐgōng - palácio da criança) e uma patologia identificada na medicina tradicional chinesa e/ou incluída como tratável com acupuntura.

Por outro lado é surpreendente como Vicente Zaffarani Neto e Ednéa Iara Souza Martins conseguiram executar esta tarefa, evidenciando mais uma vez o valor dos modelos abstratos (teórico-científicos ou míticos- tradicionais) para delimitar um fenômeno ou transtorno (um distúrbio mental neste caso) discriminando suas nuances e variações com suas ferramentas conceituais para classificação e intervenção clínica.



A patologia em questão é descrita em chinês com os ideogramas 歇斯底里 (xiē, sī, dǐ, lǐ) traduzido para línguas ocidentais e vocabulário médico atual como “histeria” onde literalmente: xiē 歇: significa ir para a cama, descansar, nocautear; sī 斯 : é o pronome “este”, “esta”; 底 dǐ: traduzível por “inferior” ou “fundus” (latim para "fundo") um termo anatômico que se refere à parte de uma concavidade em qualquer órgão, que está na extremidade distante de sua abertura; e finalmente lǐ 里: interior, forro revestimento, vizinhança, local onde se vive.

Os ideogramas que designam a “histeria” podem ter sido adotados desde sua incorporação à medicina chinesa após a revolução cultural, já fazem parte da relação de patologia incluídas no Livro dos Quatro institutos patrocinado pelo Ministério da Saúde Pública da República Popular da China publicado em 1964. Contudo esta patologia não foi incluída na Lista com as indicações da Organização Mundial de Saúde (OMS ) para a acupuntura de 1979. Nessa lista estão doenças para as quais se tem comprovação científica da eficiência do tratamento, mas não são necessariamente as únicas doenças tratáveis pela acupuntura.

É possível ainda, que esta patologia já tenha sido estudada pelos médicos chineses que entraram em contato com as concepções da medicina hipocrática como nos mostrou os estudos do sinólogo Joseph Needham (1900 -1995) sobre a similaridade entre os conteúdos do "Livro do Imperador Amarelo" com o Corpus Hippocraticum (460 – 379 a.C.) - conjunto de textos atribuído a Hipócrates, ou os registros de contato entre tais civilizações através da "rota da seda". (Needham; Carneiro)

O conceito de histeria possui uma longa história e trajetória desde sua origem na medicina grega, incorporação à medicina ocidental cosmopolita e psicopatologia. Foi revisto por Sigmund Freud (1856-1939) em finais do século XIX, (como abordado no livro) ainda persiste na psicologia e psiquiatria dos nossos dias com o CID F44 - transtornos dissociativos (ou conversivos), a histeria de conversão com dez subcategorias (da F44.0 a F44.9) e F41.8 a histeria de ansiedade.

O próprio Freud modificou suas concepções e forma de tratamento da histeria ao longo de sua carreira de acadêmico e médico clínico, do uso da hipnose à “livre associação” e “interpretação dos sonhos” (a psicanálise); da etiologia desta neurose na sedução (ou abuso por adultos) à dissolução do “complexo de Édipo” e fantasias inconscientes. Nos legou um sofisticado modelo de interação entre a mente, o cérebro (o aparelho psíquico) e o corpo – o seu “Projeto para uma Psicologia Científica” (1950 [1895]) onde dedicou um capítulo especial à psicopatologia e à “formação simbólica” e “intensidade das ideias” na histeria.



O livro “A Histeria de Katharina de Freud Tratada com Acupuntura“ escrito por dois especialistas em acupuntura, o Vicente Zaffarani Neto, também psicólogo com especialização em psicanálise e Ednéa Iara Souza Martins autora dos Atlas dos Pontos de Acupuntura (Ed Roca, 2011), especialista em acupuntura pelo Conselho Regional de Odontologia, nos apresenta uma cuidadosa revisão destes dois momentos ou aspectos desta síndrome.

Está subdividido em 9 capítulos a saber:

1 - A Medicina Tradicional Chinesa na Era Científica
2 - A Katharina de Freud
3 - "Sobre o Mecanismo Psíquico dos Fenômenos Histéricos”: Comunicação Preliminar (1893)
4 - O Significado das Emoções
5 - Etiopatogenia na Medicina Tradicional Chinesa
6 - Função Psíquica na Medicina Tradicional Chinesa
7 - Etiologia e Patogênese das Doenças Psíquicas na Medicina Tradicional Chinesa
8 - Classificação das Doenças Mentais na Medicina Tradicional Chinesa
9 - A Histeria de Katharina na Medicina Tradicional Chinesa

Os autores em sua cuidadosa revisão dedicam pelo menos três capítulos a análise do modelo freudiano de descrição/intervenção na histeria e modernas concepções sobre a psicofisiologia (na concepção ocidental) das emoções além de procederem uma cuidadosa revisão das concepções da medicina tradicional chinesa sobre as doenças mentais e particularmente sobre a histeria, como era de se esperar.

A classificação das doenças mentais descritas aqui corresponde ao apresentado no livro Tratamento das Doenças Mentais por Acupuntura e Moxabustão, de Ye Chenggu, publicado e traduzido em Pequim, o que diminui as chances de erros de tradução e interpretação. Na visão da medicina tradicional chinesa adotada por Zaffarani Neto & Martins além da histeria, entre as doenças mentais incluem ou destacam-se, principalmente:

• Palpitação e estupor.
• Insônia.
• Sonolência.
• Amnésia.
• Síndrome de bentun.
• Depressão.
• Síndrome de síncope.
• Esquizofrenia (depressiva e maníaca).
• Epilepsia.

Na medicina Tradicional Chinesa histeria é comumente definida como um distúrbio mental provocado pelo fogo, resultante da repressão das emoções e frustração (Livro dos 4 institutos; Xi Wenbu). A revisão realizada por Zaffarani Neto & Martins, não foge a este consenso de associação à desejos insatisfeitos e excessos emocionais, reconhece porém a complexidade das manifestações dos sintomas e demanda de distinguir a histeria das síndromes zang zao (agitação visceral, depressão, histeria); meihe (globus hystericus); melancolia; depressão e síncope.

Assinala ainda que etiologicamente pelo menos três condições “energéticas” (na concepção da medicina chinesa) podem ser identificadas e utilizadas como critério de escolha de pontos para acupuntura associados: a deterioração do “qi” (chi) do coração; a “estagnação do qi do fígado transformando-se em fogo ascendente” ; a “estagnação do qi do fígado prejudicando a função do baço (meridiano do baço-pâncreas).

Destaca as citações do Ling Shu, referentes ao equilíbrio entre o corpo a mente e o shen (o jing, o chi e o shen). Detém-se nas dificuldades e possibilidades de traduzir o Shen, espírito, consciência, energia do coração – o órgão meridiano diretamente relacionado à patologia em questão – o coração é o órgão que alberga o shen, as doenças do coração pertencem ao campo mental. Do Ling Shu, por exemplo, nos revela que no capítulo 2, se lê: "As inquietações e as infelicidades estorvam a circulação do qi.A raiva excessiva extravia. É incontrolável. O temor excessivo dispersa a mente"

No caso da histeria evidencia-se a formas como fatores patogênicos internos explicam os efeitos nocivos sobre os órgãos das emoções excessivas tanto em quantidade, como em qualidade. Apesar de enfatizar o tratamento com acupuntura ou a possibilidade de tratar o psiquismo atuando sobre os órgãos e vice-versa (o tratamento do órgão pode atuar de forma eficiente nos sintomas ou mesmo na emoção relativa ao padrão), não deixa de incluir nas recomendações ao tratamento desta patologia a necessidade de mudança de hábitos alimentares, aquisição ou desenvolvimento de técnicas e práticas de exercícios (a exemplo do chi kung, tai chi chuan e outros métodos) e sobretudo meditação, voltando-se ao shen – unificando o corpo psíquico e a mente em razão da inter-relação entre os órgãos e a atividade mental.

Sobre a mente consciência ou inteligência são frequentes a mostra de suas consultas à fontes tradicionais quando nos deparamos com a citação esclarecedora de que "A inteligência alimenta-se na vida. Deve ela estar de acordo com as 4 estações, adaptar-se ao frio e ao calor, à alegria e à raiva; situar-se na calma, a fim de harmonizar o yin e o yang, aliar força à doçura. Pode assim evitar doença e prolongar a vida'

Recuperando também para nós um “clássico” estudo ocidental, a definição de Soulié de Morant (1878-1955), para quem o o Shen:

"[...] é o plano superior, é o diretor psíquico da consciência e da compreensão, da razão, o juízo do sentido comum, a crítica; a consciência, a verdadeira inteligência; que compreende sem ter aprendido e por simples comparação utilizando algumas vezes a percepção do exterior no momento transformante e na memória do passado apartada pelo Roun (hun), para colocar de acordo com a captação, as reações hereditárias e adquiridas, e as possibilidades do real'".

Enfim, os autores desta análise de “histeria de Katharina de Freud” à luz da medicina tradicional chinesa estão de parabéns. Uma leitura essencial para antropólogos que pesquisam os textos clássicos de antigas civilizações ou "documentos etnológicos brutos" para nós ocidentais que utilizamos as ferramentas conceituais da antropologia estrutural na proposição de Lévi-Strauss.

Para este autor, o mito, nos fornece modelos que não diferem da ciência pelo gênero de operações mentais (relações de determinação ou classificação), e sim, pelas relações que estabelecem com a “percepção” (mais desenvolvida no pensamento científico) e “ a intuição sensível” (mais desenvolvida no mito - de certo modo semelhante a arte (bricolage), representando estratégias distintas do conhecimento humano (Lévi-Strauss. O pensamento selvagem, 1976).

Uma leitura essencial para neurocientistas ocupados com a integração de distintos sistemas teóricos como psicanálise - reflexologia; reflexologia - behaviorismo (medicina comportamental) ou entre a concepção de um cérebro reptil no modelo triúnico de Paul MacLean e os modelos funcionais de Luria / Anokhin etc.

Será possível uma integração entre sistemas teóricos concebidos em bases cognitivas distintas? A presente proposição baseou-se na perspectiva de que a observação de como é feita a descrição de um fenômeno patológico ou fisiológico em distintas concepções etnomédicas pode esclarecer as diferenças entre as distintas formas de explicação - intervenção em questão. Vale ver.

Referências

ZAFFARANI NETO, Vicente, MARTINS, Ednéa Iara Souza. A Histeria de Katharina de Freud Tratada com Acupuntura. SP: Roca, 2010 ISBN: 9788572418751

YE CHENGGU. Tratamento das doença mentais por acupuntura e moxabustão. SP: Roca, 2006

XI WENBU (Beijing, China) Tratado de Medicina Chinesa. SP: Roca, 1993

OMS / WHO Classificação de Transtornos mentais e de Comportamento da CID-lO: Descrições Clínicas e Diretrizes Diagnósticas - Coord. Organizo Mund. da Saúde; trad. Dorgival Caetano. - Porto Alegre: Artmed, 1993.

NEEDHAM, J.; GWEI-DJEN, L. Celestial Lancets: a history and rationale of acupuncture and moxa. UK, Cambridge University Press, 1980.

LING – SHU. Base da acupuntura da medicina tradicional chinesa. Tradução e comentários de Ming Wong. São Paulo. Andrei. 1995.

LÉVI-STRAUSS, Claude. O pensamento selvagem SP, Ed. Nacional, 1976

FREUD. SIGMUND. Publicações pré psicanalíticas e esboços inéditos. Edição Standard das Obras completas de Sigmund Freud. V. I / 24 v. (1886-1899). RJ, Imago, 1996

Escola de Medicina Tradicional Chinesa de Beijing; Escola de Medicina Tradicional Chinesa de Shanghai; Escola de Medicina Tradicional Chinesa de Nanjig; Academia de Medicina Tradicional Chinesa. Fundamentos essenciais da acupuntura chinesa (Livro dos 4 Institutos). SP, Ed. Ícone, 1995

CARNEIRO, Norton Moritz. Acupuntura baseada em evidências. Florianópolis, SC, Ed. do autor, 2000

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Women under Hysteria1876-1880
(Attitudes Passionnelles, Debut d'une Attaque; Hystéro-Épilepsie Attaque)
D.M. Bourneville and P. Régnard (montage by wikimedia commons)